02 setembro 2011

Segredo de mulher - Monteiro Lobato

Como Fidência se gabasse de ser discreta, seu marido resolveu tirar a prova. E para isso uma noite acordou-a com ar de assustado, dizendo:
- Que estranho fenômeno, Fidência. Pois não é que acabo de botar um ovo?
A mulher exclamou, arregalando os olhos:
- Um ovo?!
- Pois é pra ver. E cá está ele, ainda quentinho. Mas escute; é preciso que isto fique em segredo absoluto entre nós. Você bem sabe como é o mundo. Se a notícia corre, começam todos a troçar de mim e acabam pondo-me apelido. Segure, pois, a língua. nunca diga nada a ninguém.
A mulher jurou segredo e soube guardá-lo por umas horas, enquanto era noite e não tinha com quem tagarelar.
Mas logo que amanheceu pulou da cama e foi correndo em procura da comadre Teresa.
-Você é capaz, Teresa de guardar um segredo eterno?
-Toda a gente sabe que minha boca é um túmulo...
-Pois então ouça: meu marido esta noite botou dois ovos!...
-Não diga!...
-Pois é isso. Mas olhe!... Isto é segredo inviolável. Jure que jamais o contará a ninguém.
A comadre Teresa beijou dois dedos em cruz; mas logo que a Fidência se foi, sentiu na língua uma tal comichão que contou a história dos três ovos à tia Felizanda.
Tia Felizanda também jurou segredo, mas contou a história dos quatro ovos à prima Joaquina.
Prima Joaquina também jurou segredo, mas contou a história dos cinco ovos à sua amiga Inês...
Inês...
E o caso foi que ao meio dia a cidade inteira só comentava uma coisa - o estranho fenômeno do Zé Galinha, misterioso homem que punha cada noite doze dúzias de ovos...

(Fábula antiga recontada por Monteiro Lobato)

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